quinta-feira, 5 de abril de 2012

Dedicação exclusiva ao SUS: pensando um plano de carreira

Por Paulo Navarro de Moraes, médico sanitarista, diretor ad-hoc do Cebes e professor da faculdade de medicina da PUC Campinas.
O relatório final da 14ª Conferência Nacional de Saúde, na primeira proposta da diretriz “Por uma política nacional que valorize os trabalhadores da saúde”, aprovou que o SUS deve:
Instituir, de maneira pactuada na mesa de negociação permanente do SUS, um Plano de Cargos,Ccarreira e Vencimentos (PCCV) de âmbito nacional para todos os profissionais de saúde do SUS, com vínculo trabalhista regido pelo Regime Jurídico Único (RJU) e acesso exclusivo por concurso público e que contemple as diferenças regionais.
Muito específicos na questão do vínculo trabalhista – RJU, por concurso público – os delegados e delegadas foram menos precisos ao definir que carreira é essa.
Diversas entidades representantes de trabalhadores da saúde, em especial da categoria médica, têm defendido uma carreira nos moldes da carreira do judiciário – e com salários semelhantes ao que ganham juízes, promotores e afins. Os profissionais seriam alocados nas localidades de maior vulnerabilidade e difícil acesso, e poderiam ir migrando para centros maiores com a progressão na carreira.
Considero a analogia razoável, embora tenha uma diferença importantíssima entre o trabalho dos trabalhadores da saúde e o dos trabalhadores do judiciário: os últimos exercem função típica e exclusiva de Estado, enquanto os primeiros podem trabalhar na iniciativa privada e no SUS. Ninguém nunca ouviu ou irá ouvir falar sobre uma UNIJUIZ, ou seguros privados de justiça. Entretanto, todos já ouvimos falar em planos e seguros privados de saúde.
Parece-me mais próxima uma analogia com a carreira docente das Universidades Federais.  Ninguém desconhece que existem faculdades privadas, tampouco que existem professores que atuam simultaneamente no público e no privado. O diferencial que existe é que, se o professor atuar em regime de dedicação exclusiva às universidades federais, terá rendimento muito maior do que se trabalhar em regime misto.
Uma das principais queixas dos trabalhadores é a de que têm que ter vários empregos para poder ter uma renda compatível com sua expectativa. Poderíamos pensar em uma carreira SUS nos moldes da carreira docente das Universidades Federais, com maior rendimento para os trabalhadores que se dispusessem a trabalhar exclusivamente no Sistema Único de Saúde. Também em incentivo para que se mantivessem estudando, fazendo cursos, atualizações, especializações, etc., e com isso progredindo na carreira.
Vejo um “tripé” de atuação que poderia ser desenvolvido pelos profissionais de saúde em regime de dedicação exclusiva, aos moldes do tripé ensino-pesquisa-extensão das universidades:  Assistência, Formação e Controle Social. Além do papel assistencial (mais clássico), esses trabalhadores teriam também compromisso com a formação de novos profissionais de saúde (em parceria com as instituições de ensino, desenvolvendo a tese da “rede escola”) e com a participação nos espaços de gestão colegiada (colegiados gestores, conselhos locais de saúde). Em síntese: um trabalhador 100% dedicado ao desenvolvimento do Sistema Único de Saúde.
Essa carreira, segundo a própria definição da Conferência, precisaria ter base regional (por região de saúde), de forma que fosse possível o mecanismo de iniciar na cidade mais afastada e progredir até o maior centro urbano da região de saúde, se for da vontade do trabalhador.
Imagino que o regime de dedicação exclusiva possa concretamente atender às expectativas dos trabalhadores por maior valorização e, ao mesmo tempo, atender à demanda dos usuários pelo provimento e fixação de profissionais de saúde que atuem de maneira mais dedicada à construção do SUS em sua plenitude.
Fica, então, como contribuição ao debate sobre a Carreira SUS, e como convite ao debate.

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